"O Supremo Tribunal Federal retomou na sexta dois julgamentos essenciais para se tentar reduzir a judicialização relacionada a medicamentos. Um deles busca definir a responsabilidade sobre o pagamento de remédios aprovados na Anvisa, mas que não estão incorporados ao SUS e outro, relacionado ao fornecimento de medicamentos de alto custo.
No caso dos medicamentos de alto custo, o julgamento analisa o dever do Estado de fornecer medicamentos de alto custo não incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS) a pacientes com doenças graves e sem condições financeiras para adquiri-los. O caso, que envolve o Tema 6 de Repercussão Geral, busca estabelecer diretrizes para evitar a judicialização excessiva dessa questão. O placar está 4x1 contra a tese do ministro aposentado Marco Aurélio Mello, com Edson Fachin, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso acompanhando a divergência de Gilmar Mendes.
Em seu voto, Marco Aurélio Mello reafirmou o dever do Estado em garantir o direito à saúde, considerando o medicamento imprescindível para o tratamento e a possível incapacidade financeira do paciente. Ele argumentou que, embora o fornecimento de medicamentos dependa de políticas públicas, a judicialização é legítima quando há violação do mínimo existencial, independentemente de restrições orçamentárias.
Voto Conjunto
Os ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, por sua vez, apresentaram voto conjunto — com visão que, por ora, tem mais adesão. Eles trouxeram à tona premissas para justificar a limitação da concessão judicial de medicamentos a casos excepcionais. Eles destacaram que, devido à escassez de recursos públicos, não é viável ao Estado fornecer todos os medicamentos solicitados judicialmente, sob o risco de comprometer a eficiência e a sustentabilidade do SUS. Além disso, os ministros ressaltaram que decisões judiciais que beneficiam litigantes individuais podem prejudicar a maioria da população dependente do SUS, afetando o princípio da igualdade e universalidade no acesso à saúde
O voto também destacou a importância de respeitar as análises técnicas de órgãos especializados, como a Conitec, que avalia a eficácia, segurança e “custo-efetividade” dos medicamentos. As decisões judiciais, sublinham, “devem ser embasadas em evidências científicas robustas e seguir os parâmetros estabelecidos pelos órgãos técnicos”.
Requisitos
A tese proposta pelos ministros estabelece que o fornecimento judicial de medicamentos não incorporados pelo SUS somente será possível quando cumpridos requisitos como a comprovação da incapacidade financeira, a demonstração da eficácia do medicamento com base em evidências científicas e a inexistência de substitutos terapêuticos disponíveis.
O ministro Gilmar Mendes também destacou um estudo do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre os substanciais gastos da judicialização de remédios. “Na União, de 2008 a 2015, os gastos com o cumprimento de decisões judiciais para a aquisição de medicamentos e insumos saltaram de R$ 70 milhões para R$ 1 bilhão, um aumento de mais de 1.300%”.
Prazos
A expectativa é que o STF conclua o julgamento até 13 de setembro, consolidando parâmetros claros para futuros casos. Mas há a possibilidade de um ministro pedir destaque e levá-lo de volta ao Plenário. Os votos proferidos hoje provocaram reação da Interfarma. Em entrevista ao JOTA, o presidente da entidade, Renato Porto afirmou haver risco de aumento da judicialização.
Tema 1234
Ministros iniciaram também o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1366243, com repercussão geral reconhecida, no Plenário Virtual. O tema 1234 fala sobre a responsabilidade pela oferta de medicamentos aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas que não foram incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS).
No voto, o ministro relator, Gilmar Mendes, define os critérios de custeio conforme acordos estabelecidos em etapas anteriores do processo — com participação da União, dos estados e dos municípios. Ele também centraliza a competência da Justiça Federal para analisar os casos de medicamentos não incorporados com custo unitário igual ou superior a 210 salários-mínimos. O ministro estabelece ainda os fluxos processuais a serem seguidos.
Competência Federal
Quando o produto analisado não tiver registro na Anvisa, o exame do caso deve ser feito exclusivamente pela Justiça Federal, independentemente do valor cobrado. Além disso, os juízes podem solicitar auxílio da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) nos casos em que os remédios não tenham preço fixado no país.
Segundo Mendes, quando for reconhecida a necessidade de fornecimento, o custeio seguirá os seguintes padrões:
medicamentos não incorporados cujo custo anual unitário seja igual ou superior a 210 salários-mínimos serão custeados integralmente pela União;
para aqueles com custo anual unitário superior a 7 salários-mínimos e inferior a 210 salários-mínimos, a União custeará 65% do valor;
fármacos oncológicos não incorporados têm um percentual de ressarcimento de 80% se o custo for superior a 7 salários-mínimos.
O relator destaca que o Poder Judiciário deve atuar analisando obrigatoriamente o ato administrativo que negou a incorporação do medicamento pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), verificando a legalidade da decisão sem substituir a vontade do administrador. Além disso, o juiz deve determinar qual ente público é responsável pelo fornecimento do medicamento e, em caso de dificuldades operacionais, pode ordenar diretamente ao fornecedor a entrega do medicamento.
O procedimento para judicialização incluirá a criação de um campo no cadastro dos Tribunais para registrar o princípio ativo do medicamento pleiteado, como critério obrigatório para o ajuizamento da ação.
Além disso, os juízes devem intimar a Administração Pública para justificar a negativa de fornecimento na esfera administrativa, conforme os fluxos aprovados. A implementação de uma plataforma nacional para governança colaborativa entre os Entes Federativos também será essencial para a análise da legalidade dos atos de indeferimento.
Preços avaliados
No voto, o ministro detalha ainda como devem ocorrer as avaliações sobre preço. “Em qualquer situação, eventuais discussões sobre o preço do medicamento, a cargo dos distribuidores, fornecedores, fabricantes e representantes, não podem servir de empecilhos para o fornecimento do fármaco ao jurisdicionado. Nessa situação anterior, o(a) magistrado(a) deverá determinar que o valor de venda do medicamento seja limitado ao preço com desconto, proposto no processo de incorporação na Conitec (se for o caso, considerando o venire contra factum proprium/tu quoque e observado o índice de reajuste anual de preço de medicamentos definido pela CMED), ou valor já praticado pelo ente em compra pública, aquele que seja identificado como menor valor”, escreve.
O julgamento ocorre no Plenário Virtual e deve terminar na próxima sexta-feira (13/9). Até o momento, quatro ministros acompanharam o relator: Edson Fachin, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso e Cristiano Zanin."
UMA TRAGÉDIA ANUNCIADA
Decisão do STF ameaça à vida de milhares de pacientes com doenças raras
Autor: Antoine Souheil Daher - Presidente da FEBRARARAS - Federação Brasileira das
Associações de Doenças Raras
Petição Pública - Pela Obrigatoriedade de o Estado fornecer medicamento de alto custo a portador de doença grave que não possui condições financeiras para comprá-lo. Assine, compartilhe!
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